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Falhas e superlotação revelam que metrô de BH parou no tempo

10.09.11 São Paulo

metro bh ultrapassadoFalhas e superlotação revelam que metrô de BH parou no tempo Com demanda que dobrou em 10 anos e fechou 2010 em 50 milhões de pessoas, sistema não foi renovado. Falta de investimento, que deixa usuários espremidos, já ameaça manutenção.

 

 
Muita gente, muita espera, pouco espaço: serviço não acompanhou o crescimento da demanda nem em infraestrutura nem em atualização de maquinário (Euler Junior/EM/D.A Press)     
Muita gente, muita espera, pouco espaço: serviço não acompanhou o crescimento da demanda nem em infraestrutura nem em atualização de maquinário

A fila começa na catraca, na entrada da estação. Na escada rolante que dá acesso à plataforma, uma multidão se amontoa e se desloca espremida até embarcar. Cerca de 250 passageiros conseguem entrar por vagão, mas outros tantos desistem e assumem a linha de frente à espera do próximo carro, com expectativa de seguir viagem assentados. Quando conseguem, ainda estão sujeitos a se tornar reféns de falhas no serviço, como a que deixou usuários presos por 40 minutos, na terça-feira, em uma composição parada entre as estações Horto e Santa Inês, na Região Leste da capital. É nesse passo que se anda de metrô em Belo Horizonte. Mas esse tipo de pane dispara o alerta para uma questão maior e mais preocupante: ao mesmo tempo em que se travava a luta pela implantação das linhas 2 (Barreiro/Santa Tereza) e 3 (Pampulha/Savassi), o sistema envelheceu. Enquanto o número de usuários dobrou em 10 anos (de 25 milhões em 2001 para 50 milhões em 2010) trens e vagões se degradaram, a frota não foi renovada e a falta de verba começa a ameaçar o mais básico dos cuidados: a manutenção.

O resultado aparece no cotidiano. As cerca de 200 mil pessoas que usam diariamente a única linha de 28 quilômetros viajam com um incômodo companheiro: a superlotação. Além de não ter acompanhado o crescimento populacional da cidade, o sistema implantado há 25 anos é o mesmo, está obsoleto, com sinalização precária e há cinco anos conta com o mesmo montante de recursos para manutenção. A previsão de modernizar a frota e aumentar o número de vagões é uma esperança ainda sem data.

Na avaliação do diretor de Administração e Finanças do Sindicato dos Metroviários e Conexões do Estado de Minas Gerais (Sindmetro-MG), Sérgio Leôncio, a lista de problemas que o metrô da capital enfrenta hoje pode ser resumida a uma única questão: falta de investimento. Segundo ele, a escassez de recursos extrapolou os projetos de ampliação do sistema e de modernização da frota e já alcança níveis extremos, como a manutenção dos carros. “O pessoal da oficina faz milagre, porque falta dinheiro para comprar equipamentos, faltam peças, que inclusive não são mais fabricadas, já que o modelo é dos anos 80. Já houve casos em que o gerente de oficina tirou dinheiro do próprio bolso para pagar o custeio de uma peça para não deixar o trem parar até que fosse concluída uma licitação”, afirma Leôncio.

As críticas do sindicato também se estendem ao sistema de sinalização. “Está ruim, degradado. Não suportaria o aumento da frota, caso ocorresse”, sustenta o sindicalista. Apesar de não operar com risco iminente de acidente, a situação, conforme o diretor, está no limite. Uma das observações feita por ele diz respeito à implantação da Cidade Administrativa, na Região Norte da capital. “Com essa nova movimentação de pessoas, a estação Vilarinho passou a receber um contigente enorme de pessoas. São cerca de 25 mil diariamente”, diz. “Em várias estações, o metrô de BH tornou-se excludente. Deixa passageiro para trás, porque não comporta o volume de pessoas que querem embarcar”, afirma. “A população sofre com atrasos, vagões entupidos, sem climatização e com longos espaços entre as viagens. Por outro lado, funcionários são constrangidos e até mesmo ameaçados diante de problemas que são diários.”

Suplício

Constatar as palavras na prática não é tarefa difícil. “O sistema é desconfortável, atrasa e é lento. O número de pessoas nas estações é cada vez maior, mas o metrô não acompanhou essa demanda de novos passageiros. É preciso fazer um estudo sério de gestão de logística”, cobra a consultora Regina Maria, de 41 anos, que usa o serviço diariamente entre as estações Eldorado e Vilarinho. O funcionário público Luiz Fernando Teixeira, de 45, segue na mesma linha. “É desgastante andar de metrô, porque ele está sempre lotado e tem intervalos de viagem muito extensos’, diz.

O problema das panes também é alvo de crítica entre os passageiros. “Já fiquei parada por muito tempo dentro do metrô e os funcionários nem mesmo nos avisam o motivo. É horrível, porque a gente fica tenso e atrasa a viagem. Um horror! Não sei que cálculo fazem, porque os trens estão sempre atrasados”, reclama. O incremento de vagões e a ampliação até Betim também foram lembrados pela operadora de telemarketing Elizângela Fonseca, de 37. “Se tivesse mais carros, a condição de transporte seria melhor e, se fosse até Betim e outras cidades da região metropolitana, não precisaríamos perder tanto tempo em longos engarrafamentos nas rodovias e dentro da cidade”, diz.

Não cabe mais ninguém
Lata de sardinha: sem verba para expansão, metrô de BH leva passageiros espremidos nos vagões (Euler Júnior/EM/D.A Press)     
Lata de sardinha: sem verba para expansão, metrô de BH leva passageiros espremidos nos vagões

O serviço prestado de forma desconfortável à população se soma ao problema da demanda reprimida que o sistema tem. O consultor de transporte e trânsito do Instituto da Mobilidade Sustentável Rua Viva, João Luiz da Silva Dias, com a autoridade de quem já presidiu a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), afirma que muitas estações de integração do metrô com ônibus deixam de receber novas linhas porque o sistema não comportaria mais passageiros. “Pessoas que vêm de Sabará, na Grande BH, por exemplo, poderiam descer na Estação José Cândido e seguir seus destinos de metrô. Isso agilizaria a viagem, evitaria o desgaste físico do passageiro e os engarrafamentos. No entanto, o metrô não suportaria. Está operando no limite”, reconhece.

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Também ex-presidente da BHTrans, empresa que gerencia o trânsito na capital, João Luiz argumenta que o sistema não está obsoleto, mas precisa ser ampliado com urgência. “Poderíamos operar com até 12 carros, mas estamos com quatro em cada um dos 25 trens. Seis vagões já seriam suficientes. De 1,1 mil pessoas por locomotiva, passaríamos a levar 1,6 mil. Isso significaria uma aumento de quase 50% na oferta”, calcula. Aliado a isso, o consultor afirma que é preciso expandir o metrô até Betim e implantar a linha 2. “Se isso for feito, os trens atuais passariam a operar no trecho Santa Tereza/Betim, enquanto os novos carros da linha 2, que serão mais leves e poderão andar em velocidades mais altas, fariam o percurso Santa Tereza/Vilarinho, onde a demanda é maior.

Essa medida seria, na avaliação do especialista, a saída para um erro que teve início na implantação do metrô. “Os trens de hoje são adequados para longas distâncias, de no mínimo 3,5 quilômetros, mas estão operando trechos de até 1,3 quilômetros. Precisam de pelo menos 500 metros para atingir 60km/h e de mais 350 metros para parar. Na verdade, andam muito pouco no que chamamos de velocidade patamar, que é quando a viagem é desenvolvida”. O modelo atual de trens pode alcançar até 80km/h, o que não ocorre porque as distâncias entre as estações são curtas e as composições precisariam de mais espaço para acelerar e frear. “É um trem metropolitano. Não tem condições de ter um desempenho mais rápido. E mesmo se diminuísse o intervalo mínimo de viagem, que hoje é de 5 minutos, não adiantaria, porque faltariam trens para preencher as outras viagens”, explica. Além de ressaltar a necessidade de garantir mais investimentos para o sistema de BH, o consultor destaca a importância de levar adiante a regionalização. “Em São Paulo e no Rio de Janeiro, estados e municípios assumiram o sistema, o que não ocorreu com Minas, porque houve impasse sobre o déficit operacional, que ficava em torno de 30%. É preciso negociar isso para melhorar a qualidade do serviço”, afirma.

Verba só dá para o essencial

Mateus Parreiras
 
Metrô não atende a demanda de passageiros em BH. Além disso, está velho e requer manutenção (Euler Júnior/EM/D.A Press)     
Metrô não atende a demanda de passageiros em BH. Além disso, está velho e requer manutenção

Mesmo que quisesse investir em trens novos e na ampliação dos vagões de suas composições, a Metrô BH – diretoria regional da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) – não poderia fazer esse tipo de expansão. De acordo com a companhia, a quase totalidade dos R$ 51 milhões previstos para seu orçamento do ano será aplicada nas ações que possibilitam a operação regular e a manutenção do serviço.

Sobre os cuidados com o sistema, a Metrô BH sustenta que são realizadas manutenções diárias, em três turnos ininterruptos. “De segunda a sexta-feira, todas as noites, um dos trens entra em manutenção. O ciclo dura 24 horas, quando o trem volta a ser liberado para a operação”, informa a empresa, acrescentando que são checados, em média, 200 itens por dia no pátio do São Gabriel, que abriga oficinas de mecânica, pneumática, eletrônica, pintura, edificações e vias, entre outras.

A CBTU-Metrô BH informou já ter solicitado a compra de novos trens e a previsão é de que sejam adquiridas 10 composições. Sobre o prazo, a resposta é nebulosa: “Assim que houver posicionamento da administração central”.
Para o Orçamento de 2012, enviado para aprova
ção no Congresso, o governo federal previu apenas R$ 450 mil para ampliações do sistema existente e projetos das linhas 2 e 3. É pouco para qualquer melhoria mais profunda, mas a simples aprovação abre caminho para que, posteriormente, injete-se mais recursos nas áreas definidas, por meio de repasses como os do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal.

Entre os mais importantes investimentos realizados nos últimos cinco anos estão o Terminal Vilarinho, orçado em R$ 33 milhões, e inaugurado em 2008, e a modernização do Centro de Controle Operacional, que custou R$ 5 milhões. “Vale lembrar que o Metrô de BH teve recursos contingenciados (retidos) no Orçamento 2011 e que está fazendo todas as gestões necessárias para descontingenciar seu limite orçamentário”, informa a companhia.

Enquanto isso, São paulo se queixa

Embora incomparavelmente maior que o de Belo Horizonte, com 70 quilômetros de linhas pelos quais se espalham mais de 60 estações, o metrô de São Paulo não desfruta da melhor avaliação dos usuários. Em outras proporções, as razões do problema são semelhantes: ampliação de linhas e de estações que atraem mais usuários, associadas a falhas no sistema. Pesquisa do Instituto Datafolha divulgada esta semana mostra que o serviço nunca foi usado por uma parcela tão grande da população, mas também que a avaliação é a pior desde 1997, quando a sondagem começou a ser feita. Desde então, é a primeira vez que menos da metade dos entrevistados (47%) aprova a qualidade do transporte. A queda é de sete pontos percentuais desde 2008.